segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Bresson

Por Nathalia Cavalcante 

Robert Bresson
     Robert Bresson apresenta em sua obra a essência captada pelo cinematógrafo, assim designado pelo diretor, de onde pertenciam seus filmes. “Filmes de cinematógrafo: emocionais, não interpretativos” (BRESSON, 2005, p. 79). Para provocar a coerência na forma de transmitir uma história, Bresson unia a simplicidade, sem efeitos, ou despida de elementos que pudessem desviar o foco e tornarem-se maiores em relação a seus modelos. “Quantidade, enormidade, falsidade dos meios cedendo o lugar à simplicidade e precisão. Tudo conduzindo à medida do que basta a você” (2005, p. 79).
            Atores eram considerados viciados em trejeitos teatrais e carregavam impurezas ao personagem. Por isso, os modelos, até a experiência bressoniana, não haviam se relacionado com o meio cinematográfico. Para Bresson, eles sim, transportavam a alma do personagem, naturalmente. Afastados de preceitos que pudessem caracterizá-los como robôs, comandados por ordens de diretores. “Modelo. Sua voz (não trabalhada) nos dá sua personalidade, sua filosofia, bem mais que seu aspecto físico” (2005, p. 62). As ações não eram mecânicas, mas sim, naturalizadas, conforme a necessidade requisitada pela história e, consecutivamente, os personagens. Bresson buscava esse objetivo, incessantemente. “Os gestos que ensaiavam vinte vezes mecanicamente, seus modelos vão domá-los, soltos na ação do seu filme” (2005, p. 58)
            Sendo dessa forma, os modelos eram seu principal desígnio. A consequência desse trabalho refletia na lente do cinematógrafo, que se preocupava em ações e rostos libertos de interpretações, mas sim, o embebidos no ser. A captura desses modelos em sintonia com o universo fílmico, não necessitam de inserções de movimentos desnaturalizados da câmera. “Os travellings e panorâmicas aparentes não correspondem aos movimentos do olho. É separar o olho do corpo. (Não utilizar a câmera como uma vassoura)” (2005, p. 78).
            Além dessas características, Bresson prezava por sons diegéticos, inseridos diretamente na cena, longe de músicas inseridas posteriormente, como forma de provocar um grau de emoção ao espectador. A natureza das passagens se relaciona com os modelos como, por exemplo, em “Uma mulher suave”, de 1969, em que a personagem principal interage com um vitrola e imprime nas músicas escolhidas, suas indagações sobre a vida. O som deve ter autonomia e responder por sua presença. “Um som não deve jamais socorrer uma imagem, nem uma imagem socorrer um som” (2005, p. 52). Assim como na realidade, em que os sons fazem parte do cotidiano, são próprios dele, sem a inclusão futura. Assim como os modelos, personagens únicos, com exceção de Jean-Claude Guilbert, que participou, em 1966, de “A grande testemunha” e, em 1967, em “Mouchette, a virgem possuída”.
    
A grande testemunha
        Robert Bresson, então, trabalhava em seus filmes de cinematógrafo de forma metódica, procurando ressaltar o porquê de suas escolhas, e como essas refletiam na obra. A realidade bressoniana compreendia na sensibilidade, avesso ao automatismo, que segundo Bresson, era vigente na interpretação de atores e a maneira empregada, por eles, em sua definição de arte. Por isso, “o verdadeiro não está incrustado nas pessoas vivas e nos objetos reais que você utiliza. É um ar de verdade que suas imagens adquirem quando você as reúne numa certa ordem” (2005, p. 65).
Mouchette
            Contudo, Bresson expressava o ser em autoconhecimento. “A precisão das relações impede o cromo. Quanto mais as relações são novas, mais o efeito de beleza é vivo” (2005, p. 65). O modelo encontrava por si só, a partir desse entendimento bressoniano, a realidade fílmica. “AS RELAÇÕES QUE ESPERAM OS SERES E AS COISAS PARA VIVER [sic]” (2005, p.65). E assim, Bresson, conduzia ao cinematógrafo corpos em descobrimento. Mãos vivas e ações genuínas, lágrimas banhadas de emoção própria. A verdade de Bresson longe do automatismo, mas imbuída em autenticidade.





REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BRESSON, Robert. Notas sobre o cinematógrafo. Trad. Evaldo Mocarzel e Brigitte Riberolle. São Paulo: Iluminuras, 2005.

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